Trump recua parcialmente em guerra comercial, mas aumenta tarifa contra a China e alerta mercados globais

Em uma guinada surpreendente e vista como um alívio temporário para os mercados globais, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, recuou parcialmente de sua ofensiva tarifária nesta quarta-feira (10). Ele reduziu para 10% todas as novas tarifas de importação anunciadas no dia 2 de abril, estabelecendo ainda uma pausa de 90 dias para a entrada em vigor das medidas. No entanto, na contramão do recuo, Trump aumentou de 104% para 125% a tarifa sobre produtos importados da China, com efeito imediato, intensificando a pressão sobre Pequim após novas retaliações do governo chinês.

A medida representa mais uma reviravolta na volátil política comercial da Casa Branca. Até poucos dias atrás, Trump havia declarado que “nunca mudaria suas políticas tarifárias”, mas voltou atrás ao reconhecer que a turbulência nos mercados exigia flexibilidade. “É preciso ser flexível”, disse a repórteres em Washington, admitindo que o cenário recente estava “bastante sombrio”.

A resposta chinesa não demorou: Beijing elevou para 84% a taxa sobre importações dos EUA, aprofundando o conflito comercial entre as duas maiores economias do mundo. Apesar disso, Trump acenou com uma possível trégua, declarando estar “confiante em um bom acordo” e elogiando o presidente Xi Jinping, a quem chamou de “uma das pessoas mais inteligentes do mundo”.

UE reage e mira em estados republicanos

Antes do anúncio da pausa, a União Europeia havia aprovado tarifas de 25% sobre uma ampla gama de produtos norte-americanos, mirando em especial setores estratégicos de estados republicanos, como carne do Kansas e Nebraska, cigarros da Flórida e madeira do sul dos EUA. As primeiras medidas entram em vigor em 15 de abril, com novas rodadas previstas para 15 de maio e 1º de dezembro. A UE classificou as tarifas de Trump como “injustificáveis”, mas sinalizou que as contramedidas podem ser suspensas caso os EUA aceitem uma negociação “justa e equilibrada”.

Reação política e mercados em alerta

A decisão foi mal recebida por parte do Partido Republicano, não pela mudança em si, mas pela forma abrupta e descoordenada com que foi comunicada. Parlamentares souberam da notícia por meio de um post na Truth Social, enquanto altos funcionários da Casa Branca discursavam no Congresso sem conhecimento da nova diretriz. “Que sujeito desconcertante é esse Donald Trump”, ironizou a revista The Economist, destacando o comportamento errático do presidente, que “promete apenas um adiamento, não uma suspensão definitiva”.

A colunista Heather Long analisou que o fator determinante para a mudança foi a reação negativa dos mercados de títulos. “Trump cedeu ao mercado de títulos. As pessoas estavam ficando enjoadas”, afirmou. O movimento remete à crise vivida pela ex-primeira-ministra britânica Liz Truss, que renunciou após uma reação semelhante a um pacote econômico mal recebido. “Os Estados Unidos não parecem mais sólidos como uma rocha”, concluiu Long.

E o Brasil?

No Brasil, a resposta do governo tem sido cautelosa e pragmática. O colunista Celso Ming observa que o governo Lula, embora crítico do livre comércio em outros tempos, agora vê com preocupação o impacto das medidas protecionistas de Trump no sistema multilateral de comércio, que afeta diretamente a cadeia global de produção.

Já o presidente do IBGE, Márcio Pochmann, foi além e publicou uma análise em tom histórico, evocando Raúl Prebisch e Celso Furtado, ao afirmar que Trump aplica hoje nos EUA ideias defendidas pela Cepal – modelo de substituição de importações adotado por países latino-americanos no século XX. Para o jornalista Pedro Doria, porém, o ponto fraco da análise é justamente o histórico de fracassos desse modelo, e a ironia de vê-lo ressurgindo em pleno coração do capitalismo global.

Conclusão

A decisão de Donald Trump de recuar parcialmente em sua guerra tarifária, ao mesmo tempo em que aumenta a pressão sobre a China, revela o quanto o cenário econômico global continua instável. A pausa de 90 dias pode acalmar momentaneamente os mercados, mas não elimina o risco de novas escaladas. E, como alerta a Economist, com Trump, “há sempre motivos para acreditar que ele reavivará suas ameaças antes do prazo final”.